domingo, 27 de novembro de 2011

A VISITA AO CEMITÉRIO

O túmulo do Soldado Anônimo

Estou em São Paulo há 16 anos, e nunca tinha visitado um cemitério. Não em condições de visita. As duas únicas vezes que estive foi para cumprir protocolo, ou melhor, para fazer papel de educado, pois foi meio a contragosto. A situação exigia pelo fato de conhecer os defuntos, não necessariamente para ir prestar homenagem.

Hoje, estive em um Congresso no Pavilhão Vera Cruz, e na volta resolvi ao passar em frente ao Cemitério Vila Euclides e entrar para ver como era.

Estava meio deprimido, me sentido só. Estive doente por dias a fio e não tive visita ou telefonemas, de forma que, quando a gente está dodói, parece que os sentimentos se intensificam e a carência se aflora. Não namoro há muito tempo, o que se torna um problema quando a gente vive só há muitos anos, e não tem quem faça um chá ou lhe pegue um remédio quando não se consegue levantar da cama.

Ando me sentindo meio só, meio sem ninguém por perto. E não é só o sentimento, é o reflexo da minha vida.

Não tenho família próxima, não tenho tantos amigos, - os que tenho não são amigos, para tanto, não tenho companhia para sair, não tenho pessoas que visite a minha casa. O que é pior: não recebo ligações e nem e-mails, além de cutucadas no facebook, o que me estressa, porque detesto ser cutucado, ainda mais por pessoas que não se dão ao trabalho de conversar, apenas cutucam, como se isso quisesse falar alguma coisa.

Bem, entrei no cemitério e fui caminhando pelas quadras, pelas sepulturas perpétuas me perguntando o que vem a ser isso...

Vi túmulos bonitos, feios, deteriorados, limpos, sujos, lavados, empoeirados, e vi que mesmo dentre os mortos existe preconceitos e diferenciações. Até onde sei, o cemitério é público, e ao contrário de muitos outros, este cemitério não tem aquele lugar destinados e enterrar no chão, pessoas que não tem túmulos.

Todo cidadão sãobernardense tem direito a uma sepultura em algum de seus cemitérios, mas muitos deles estão construídos, como se não coubesse mais ninguém. Tinha túmulos limpos, espelhando enquanto o do lado estava empoeirado. E o pessoal da limpeza da prefeitura estava sobre um e outro limpando... quase perguntei, porque eles não limpavam a todos, já que estavam lá para isso. Mas me contive. Não era momento para contendas!

Lá dentro a paz reina! É um silêncio que em nenhum lugar da cidade tem igual.

É o local ideal para meditação. Onde ninguém lhe perturba e nem o canto dos pássaros é alto o suficiente para interromper os seus pensamentos.

Cada quadra que andava, percebia um ornamento, uma lembrança de saudade, e um sincero sentimento no ar. Como se as covas e as tumbas se comunicassem, e conversassem entre si, num tom de tristeza e paz.

Toda a paz do mundo reinava naquele lugar.

Encontrei um túmulo que me chamou a atenção. Li na sua lápide: Túmulo do “soldado desconhecido”. Uma homenagem da Prefeitura de São Bernardo aos que morreram no cumprimento do seu dever, na revolução de 1924.

Fiquei alguns minutos diante do túmulo desse soldado, imaginando como deve ter sido a sua morte e o seu enterro, sem família, sem amigos, sem ninguém para lhe prestar homenagem.

Chorei por cerca de trinta minutos, de pé ao lado desse túmulo.

Naquele momento, as lágrimas que me saiam dos olhos, eram na verdade, a expressão de toda a dor que estava sentindo, como se tivesse perdido um ente querido. Meu coração apertou, a garganta trancou e me vi inerte ao lado desse túmulo construído em tijolo, sem flores, sem velas e sem nenhum sinal de atenção de família ou conhecidos...

Foi um momento de tanta dor e angústia, que não conseguia separar o sentimento de solidão, do sentimento da perda. Sentei-me ao lado do túmulo dele, e fiz uma prece a Deus.

Na minha prece, o meu pedido foi muito simples, - como fazia tempo que não pedia nada a Deus-, pois sinto que não devo ficar pedindo a Deus, coisas das quais eu consigo fazer, e me dedico a pedir coisas, que não são palpáveis.

Depois dessa melancólica visita, resolvi voltar para casa, e no caminho, comecei a pensar em tudo o que vivi nesta hora de visita. Resolvi que voltarei sempre que quiser pensar melhor. Sempre que necessitar meditar, pois naquele lugar senti paz e sinceridade, que nem o aperto no coração e o trancamento na garganta conseguiu silenciar. Lá se consegue sentir o verdadeiro sentido que a vida nos concede.

Fiquei meio deprimido, e fico imaginando, o porquê de todos me abandonarem. Não ando dando muita atenção a todos, mas ninguém questiona ou tenta entender os meus motivos. Do contrário, todos recriminam, ao invés de procurar entender os meus motivos, e tentar ajudar.

Me sinto órfão de carinho ultimamente, e me sinto de fato como o soldado desconhecido, por este fato talvez, tanto tenha me identificado com a sua lápide.

19 de novembro de 2011
Cemitério Vila Euclides, São Bernardo do Campo / SP

O Brasão dos Sátiros